A biografia de Karl Marx

As biografias dos jogadores - sétima biografia

Capítulo 90

A partida de futebol mundial entre os filósofos

Claudio Simeoni
traduzido por Dante Lioi Filho

 

As biografias dos filósofos

 

A biografia de Karl Marx

 

Karl Marx nasce em Tréveris aos 5 de maio de 1818, o pai de origem hebraica era um advogado racionalista e iluminista com um grande conhecimento de Rousseau e de Voltaire, nunca se vinculou aos ambientes judaicos e se converteu ao luteranismo fazendo com que os filhos fossem batizados.

Karl Marx em 1835 inscreve-se junto à faculdade de jurisprudência, mas prefere a filosofia à jurisprudência. Continuou os estudos junto à Universidade de Humboldt de Berlim.

No ano de 1837 Marx abandona os estudos jurídicos para se dedicar à filosofia. Marx deu início a uma participação a um círculo de Berlim em 1937, o Doktorclub. Um círculo de ideias monárquicas-liberais que, num tempo breve, se transformou num círculo jacobino.

Em 1835 Marx escreve um ensaio com o título "A união dos crentes com Cristo" comentando uma parte do evangelho de João, mais exatamente João 15, 1 - 14, que é uma das diretivas criminosas da ideologia cristã que, após mais de um século, tornará legítimo os campos de extermínio nazistas.

Entre 1838 e 1840 prepara-se para o doutorado, e depois de um projeto inicial muito árduo, se reorganiza em um tratado "Diferença entre a filosofia da natureza de Demócrito e a de Epicuro".

Na sua tese retoma as citações de Epicuro e entre outras, Marx escreve:

"Pode-se também fazer um aceno de como Epicuro, com a doutrina do clinâmen, tem se mostrado uma imagem pálida do mundo no qual encontram-se espaços também para a imprevisibilidade e a indeterminação, quase como se fosse impossível determinar cada coisa: uma imagem que evidencia-se incredivelmente perto daquela conquistada, no ano de Novecentos, pelo físico alemão Werner Heisenberg, que afirmou na composição do seu célebre "princípio da incerteza" que é impossível conhecer simultaneamente a posição exata e a exata quantidade de movimento de uma partícula subatômica; quanto mais exatamente conhecemos a posição, menos seguros estamos da quantidade de movimento, e vice-versa."

Karl Marx "Diferença entre a filosofia da natureza de Demócrito e a de Epicuro", Bompiani, 2004, p. 47

Em 1842 Marx escreve um ensaio com o título de "Observações sobre as recentes instruções para a censura na Prússia", que porém será publicado um ano depois. A introdução, como jornalista, realiza-se por meio de um artigo cujo título é: "Debates acerca da liberdade de imprensa e sobre publicação dos debates em Reunião".

Em 17 de março de 1843 Marx deixa a direção do jornal e este, aos 21 de março, é fechado por intervenção do governo. Marx condena o servilismo dos jornalistas.

Em junho de 1843 Marx parte para Paris depois de estar casado.

Em 1844 inicia-se a questão hebraica quando a esquerda hegeliana, opondo-se à ideia da religião de estado, reivindicava a emancipação política dos hebreus. Bruno Bauer, sendo contra a esquerda hegeliana, afirmava interpretar a liberdade política como a renúncia a cada identidade particular e era contra o reconhecimento de uma identidade, racial ou religiosa, particular. Marx, em polêmica com Bauer, asseverava que para emancipar-se politicamente os hebreus deveriam, em primeiro lugar, emancipar-se da religião deles. Em síntese, era a ideologia religiosa que separava os hebreus do resto do país.

Em 1844 Marx começa a estudar os economistas clássicos. Os manuscritos econômicos e filosóficos de 1844 serão publicados somente em 1932.

Dos "Manuscritos econômicos e filosóficos de 1844", por este sistema de biografias filosóficas, é interessante a polêmica de Marx contra Hegel. Trata-se do quarto manuscrito, (o apêndice do terceiro, conforme assim deseja-se considerá-lo) inserido na série, no qual Marx usa de distâncias das concepções espiritualistas da filosofia hegeliana.

Marx escreve na "Crítica à dialética hegeliana":

'De uma parte, esta supressão é uma supressão do ente pensado, e portanto a propriedade privada pensada se suprime no pensamento da moral. E uma vez que o pensamento figura-se ser imediatamente outro dele próprio, a realidade sensível, e assim a sua ação tem para ele o valor de ação real sensível também, esta supressão no pensamento, que deixa o seu objeto sobreviver na realidade, acredita ter superado realmente o objeto, e por uma outra parte este objeto, tendo se tornado para esta, neste ponto, um momento ideal, tem para ela inclusive na sua realidade valor de uma auto-confirmação de si mesma, de uma auto-confirmação da autoconsciência da abstração.
De conseguinte, por um lado, a existência que Hegel suprime na filosofia, não é a religião real, o estado real, a natureza real, mas a religião em si mesma precisamente como um objeto do saber, isto é a dogmática; do mesmo modo a jurisprudência, a ciência política, a ciência natural. Por este lado, portanto, ele está em oposição tanto do ente real quanto da ciência que não é filosófica, à imediata ciência ou aos conceitos que não são filosóficos deste ente. Ele, assim, contradiz tais conceitos correntes.
Por uma outra parte, o homem religioso, etc., pode encontrar em Hegel a sua última demonstração.
Agora é preciso colher os momentos positivos da dialética hegeliana no âmbito de uma determinação à alienação.
a) A supressão como movimento objetivo anulatória, reconduzindo, pois a si a alienação. É isto, que está manifesto dentro da alienação, o modo de compreender a apropriação do ser objetivo através da supressão do seu desequilíbrio, o modo estranho para entender a objetivação real do homem, a apropriação real do seu ser objetivo através da anulação da determinação alienada do mundo objetivo, ou seja, através da sua supressão, na sua existência desequilibrada: de maneira que o ateísmo é, enquanto supressão de Deus, o vir-a-ser do humanismo teorético, e o comunismo, enquanto supressão da propriedade privada, é a reivindicação da vida humana real como sua propriedade, isto é, o tornar-se do humanismo prático; ou em outras palavras, o ateísmo é o humanismo mediato com ele mesmo pela supressão da religião, o comunismo é o humanismo mediato com ele mesmo pela supressão da propriedade privada. Somente através da supressão desta mediação, que no entanto é um pressuposto necessário, é que se forma o humanismo que tem início positivamente por si, o humanismo positivo.
Mas o ateísmo e o comunismo não são uma evasão, uma abstração, uma perda do mundo objetivo produzido pelo homem, as suas forças essenciais surgidas na objetividade, não constituem uma pobreza que retorna à simplicidade não natural, não evoluída. Ao contrário, são apenas e tão-somente o tornar-se real, a realização real que veio-a-ser por intermédio do homem em seu ser e do seu ser como ser real.
Assim, Hegel, captando o senso positivo da negação com referência a si mesma - embora inclusive à sua volta de maneira alienada - entende os atos com os quais o homem estranha a si mesmo, aliena o próprio ser, e aproximando-se menos de sua objetivação particular e à sua particular realização, como um ato com que ele conquista a si mesmo, muda o seu próprio ser, se faz objetivo e real. Rapidamente ele compreende - dentro da abstração - o trabalho como sendo o ato com que ele, homem, produz a si mesmo, e entende o relacionamento do homem consigo mesmo como relação de ser estranho com a atuação de si, ou seja, atuação de um ser estranho, como a consciência da espécie e a vida da espécie, num vir-a-ser.
b) Mas não considerando, ou melhor, como consequência da incoerência já descrita em Hegel, isto aparenta em primeiro lugar um ato puramente formal, porque é abstrato, e porque o ser humano em si mesmo estima-se como nenhum outro ser abstrato pensante, como autoconsciência; ou em segundo lugar, porquanto o modo de entendê-lo é formal e abstrato; e portanto, a supressão da alienação torna-se um confirmação da alienação, e o movimento da auto-produção e da auto-objetivação, entendida como auto-alienação e auto-estranhamento, que é para Hegel a manifestação absoluta da vida humana, e portanto definitiva, que tem por escopo ela própria e em si se tranquiliza, sendo alcançado pela própria essência. Este movimento na sua forma abstrata enquanto dialética, tem assim o valor da vida verdadeiramente humana, sendo todavia abstração, uma abstração da vida humana, tem o valor de processo divino, e portanto de processo divino do homem, um processo, um percurso do próprio ser absoluto distinto do homem, abstrato, puro.
Em terceiro lugar: esse processo dever ter um transportador, um sujeito; mas o sujeito se forma apenas como resultado; o sujeito que sabe ser autoconsciência absoluta, é portanto Deus, o espírito absoluto, a ideia que conhece e atua por si mesma. O homem real e a natureza formam-se em predicados puros e símbolos deste homem escondido, irreal, e dessa natureza irreal. O sujeito e o predicado estão, de conseguinte, entre eles, num relacionamento de inversão absoluta, objeto-sujeito místico. Ou subjetividade excedente do sujeito, o sujeito absoluto igual a um processo, como sujeito que se aliena e retorna a si pela alienação, mas num igual tempo retoma-a para si, e o sujeito enquanto é este processo; o círculo puro e sem repouso que se fecha em si mesmo.
Antes de tudo, temos o modo formal e abstrato de entender o ato de autoprodução ou de auto-objetivação do homem. Uma vez que Hegel identifica o homem com a autoconsciência, o objeto alienado, a realidade alienada do ser homem não é outra coisa senão a consciência, o pensamento da alienação, a sua expressão abstrata e, portanto, privada de conteúdo e de realidade, a negação. A supressão da alienação é, de conseguinte, igualmente nada mais que uma supressão abstrata privada de conteúdo, daquela abstração que é carente de conteúdo, a negação da negação. Consequentemente, a atividade da auto-objetivação, que é atividade rica de conteúdo, viva, sensível, concreta, torna-se a sua pura e simples abstração, a negatividade absoluta, uma abstração que, por sua vez, é fixada como tal e pensada como atividade por si considerada distinta, seguramente como a atividade. Já que essa assim denominada negatividade não é outra coisa senão a forma abstrata, isenta de conteúdo, daquele ato real e vivo, inclusive o seu conteúdo pode ser tão-somente um conteúdo formal, produzido e fazendo abstração de cada conteúdo. Por este motivo, as formas universais e abstratas da abstração, pertencentes a cada conteúdo, e portanto na mesma medida indiferentes a cada conteúdo determinado, precisamente por esse motivo formas válidas para cada conteúdo, as formas do pensamento, as categorias lógicas são destacadas do espírito real e da natureza real. (Desenvolveremos mais além o conteúdo lógico da negatividade absoluta).
A contribuição positiva aqui, na sua lógica especulativa, Hegel levou-a a termo dentro dos conceitos determinados, em formas fixas e universais do pensamento, de maneira que são independentes na natureza e no espírito, constituem um resultado necessário da alienação universal do ser humano, e portanto também do pensamento humano, de onde Hegel as expôs e as sintetizou como momentos do processo de abstração. Por exemplo, o ser suprimido é a essência, a essência suprimida é o conceito, o conceito suprimido...a ideia absoluta. Mas afinal o que é a ideia absoluta? Esta por sua vez suprime-se em si mesma, se não quer percorrer novamente o inteiro ato de abstração e portanto contentar-se em ser uma totalidade de abstrações ou a abstração compreendida nela mesma. Mas a abstração que se compreende como abstração sabe que não é nada; ela deve renunciar a abstração a si mesma, e assim acaba atingindo a um ser que é precisamente o seu contrário, a natureza. Toda a Lógica é de conseguinte a prova de que o pensamento abstrato não é nada por si mesmo, que a ideia absoluta é nada para si mesma, e que somente a natureza é alguma coisa.
A ideia absoluta, a ideia abstrata que << considerada com base na sua unidade, com si mesma, é intuição>> (HEGEL, Enciclopédia, 3' ed., p. 222)9, que <<na absoluta verdade de si mesma decide liberar de si mesma o momento da sua particularidade ou do seu primeiro determinar-se e do seu ser outro, a ideia imediata, como o seu reflexo, como natureza>> (I.c.), esta ideia toda que se ostenta de modo assim tão estranho e redundante, e que forneceu aos hegelianos tantas inquietudes, não é em absoluto senão a abstração - isto é, o pensador abstrato - a qual é instruída pela experiência e iluminada ao redor da sua verdade, decide em certas condições - falsas e ainda abstratas -, a renunciar a si mesma e a colocar o outro ser, o particular, o determinado, no lugar do seu ser junto a si, no seu ser nada, na sua universalidade e indeterminação, liberando de si a natureza, que ela escondia em si somente como abstração, como objeto ideal, isto é, abandonando a abstração e contemplando-se finalmente a natureza liberada por ela. A ideia abstrata que se torna imediatamente intuição, não é absolutamente nada senão o pensamento abstrato que renuncia a si mesmo decide-se pela intuição. Tudo isto transferido da Lógica à Filosofia da natureza não é outra coisa a não ser a transferência - tão difícil de se realizar para o pensador abstrato e portanto por ele descrito de modo tão propício - de abstração e de intuição. O sentimento místico, que incita o filósofo ir do pensamento abstrato à intuição, é o tédio, a nostalgia de um conteúdo.'

Karl Marx, Manuscritos econômicos-filosóficos de 1844, Crítica da dialética hegeliana, Biblioteca Repubblica-espresso, 2006, p. 138 - 141

Marx acusa Hegel de negar o valor e a relação com a existência real do homem, suprimindo o seu cotidiano em função de abstrações que tomam o lugar dos relacionamentos sociais reais. A propriedade privada, a família, o Estado não são, para Hegel, objetos reais que intercedem na sua filosofia, mas são suprimidos e substituídos por categorias abstratas e irreais. Assim, diz Marx, por exemplo, na filosofia do direito de Hegel, o direito privado é abolido, torna-se moral, a moral abolida é a família, a família abolida é a sociedade civil, a sociedade civil abolida é igual ao Estado. O pensamento antecipa-se em ser o outro dele mesmo, e é o pensamento que imagina para sobreviver o outro, o sujeito, em uma realidade que o pensamento imagina e que adverte como sendo objetiva e real. Mas o pensamento não reside na realidade, o pensamento se exprime numa condição virtual porque está alienado da realidade cotidiana habitada pelo sujeito. O pensamento, para Hegel, se eleva ao nível de patrão do homem e numa dimensão da imaginação em que pretende controlar o homem na sua ação cotidiana.

Segundo Marx, Hegel suprime, na sua filosofia, a existência do homem, suprime a religião real, o estado real, material, da sua existência. Em outras palavras, a filosofia de Hegel fala de uma imaginação enquanto, Marx ao contrário, quer conferir à filosofia um modo de se falar da vida real de um corpo que habita o mundo.

Na sua filosofia ele evidencia que o ateísmo é a supressão de Deus tal como o comunismo é a supressão da propriedade privada onde: "o ateísmo é o humanismo mediato em si mesmo pela supressão da religião, o comunismo é o humanismo mediato em si mesmo pela supressão da propriedade privada".

A supressão e a negação constituem a condição para que esse terreno seja assumido por uma nova e diversa situação: "elas são somente o realizar-se do real, a realização concretizada do real pelo homem com seu ser e pelo seu ser como um ser real".

Toda a crítica ao hegelismo tem o escopo de conduzir a dialética do idealismo abstrato de Hegel à materialidade da vida cotidiana.

A revolução marxista consiste no uso do significado do termo "dialética". Não é mais uma abstração de relação entre objetos abstratos do pensamento, mas uma relação de corpos que habitam o mundo e que entrando em relação modificam a si mesmos e o mundo.

Em 1844 Marx em Paris frequenta os círculos dos operários e dos artesãos parisienses, encontra Proudhon, Louis Blanc e Bakunin. A Prússia pede a extradição de Marx, de Paris, mas Marx aos 5 de fevereiro de 1845 parte para Bruxelas. Em 1845 Marx com Engels publica "A sagrada família".

Marx aumenta a intensidade da polêmica, com Bauer, que via no romantismo a evolução natural do iluminismo.

Em 1846 Marx e Engels escrevem "A ideologia alemã" que será publicada somente em 1932 e na Itália em 1952.

Karl Marx escreve na Ideologia Alemã:

'As ideias da classe dominante são em cada época as ideias dominantes; isto é, a classe que é a potência material dominante, na sociedade, está em igual tempo para a sua potência espiritual dominante. A classe que dispõe dos meios e da produção material dispõe assim, concomitantemente, dos meios da produção intelectual, como consequência a ela são submetidas de modo amplo as ideias daqueles aos quais carecem dos meios para a produção intelectual. As ideias dominantes não são outra coisa senão a expressão ideal dos relacionamentos materiais dominantes, são as relações materiais dominantes tomadas como ideias: constituem portanto a expressão dos relacionamentos que exatamente fazem de uma classe a classe dominante, e consequentemente constituem as ideias do seu domínio. Os indivíduos que compõem a classe dominante possuem entre outras coisas também a consciência, e portanto pensam; enquanto dominam como classe, e determinam o âmbito inteiro de uma época histórica, é evidente que esses assim o fazem amplamente, e de conseguinte, entre outras coisas, dominam inclusive como pensadores, como produtores de ideias que regulam a produção e a distribuição das ideias do seu tempo; está evidente, desta maneira, que as suas ideias são as ideias dominantes da época. Por exemplo: num período e em um país onde, o poder monárquico, aristocracia e burguesia lutam pelo poder que, assim é dividido, aparece como ideia dominante a doutrina da divisão dos poderes, doutrina que então é enunciada como <<lei eterna>>. A divisão do trabalho, que já vimos (p. [52 - 55]) como uma das forças principais da história até agora transcorrida, se manifesta também na classe dominante como divisão do trabalho intelectual e manual, de modo que no interior dessa classe uma parte se apresenta constituída por pensadores da classe (os seus teóricos ativos, conceptivos, os quais com a elaboração das ilusões dessa classe sobre ela mesma fazem o seu mister principal), enquanto os outros em confronto com estas ideias e com estas ilusões têm um comportamento mais passivo e mais receptivo, visto que na realidade são os membros ativos dessa classe, e eles têm menos tempo para elaborarem as ideias e as ilusões sobre eles próprios. No interior dessa classe, esta cisão pode decididamente desenvolver-se até criar entre as duas partes uma certa oposição e uma certa hostilidade, separação que, todavia, cai por si e alcança inesperadamente uma colisão prática que coloque em perigo a própria classe: nesse momento difunde-se também o aspecto de que as ideias dominantes não são as ideias da classe dominante, e de que têm um poder diferente do poder dessa classe. A existência de ideias revolucionárias, em uma determinada época, já pressupõe a existência de uma classe revolucionária cujos pressupostos já mencionamos (p. [56 - 59] como ocorrem.
Se nesse momento, considerando-se o transcorrer da história, são desvinculadas as ideias de classe dominante, da classe dominante, e se tornam autônomas, se nos limitamos a dizer que numa época dominaram estas ou aquelas ideias, sem preocupação com as condições da produção e dos produtores destas ideias, e se portanto os indivíduos são ignorados, bem como as situações do mundo que estão na base de tais ideias, então se poderá dizer que, por exemplo, no tempo em que a aristocracia dominava, também dominavam os conceitos de honra, de fidelidade, etc., e que durante o domínio da burguesia também dominavam os conceitos de liberdade, de igualdade, etc. Estas são, no conjunto, as imaginações da mesma classe dominante. Esta concepção na história, que é comum a todos os historiadores, particularmente a partir do século dezoito, deverá necessariamente golpear, indo contra o fenômeno de que as ideias cada vez mais abstratas dominam, isto é ideias que assumem sempre mais a forma da universalidade. Efetivamente, cada classe, que toma o lugar de uma outra classe que dominou em primeiro lugar, é forçada a, se não fosse para atingir o seu escopo, representar o seu interesse como sendo o interesse comum de todos os membros da sociedade, ou seja, para se manifestar de forma idealista, dando às próprias ideias a forma da universalidade, a representá-las como sendo as únicas que são racionais e válidas universalmente. A classe revolucionária se apresenta, seguramente, só pelo fato de se contrapor à outra classe, não como classe, propriamente dita, mas como representante da sociedade inteira, surge como a massa inteira da sociedade, indo contra à unica classe dominante. Isto lhe é possível porque, na realidade, desde o início que o seu interesse está ainda mais vinculado ao interesse comum de todas as outras classes, que não são dominantes, e sob a pressão dos relacionamentos até agora existentes, não pôde se desenvolver como interesse típico de uma classe particular. A sua vitória convém também, portanto, a muitos indivíduos das outras classes que não alcançam o domínio, mas somente enquanto coloca esses indivíduos em condições para elevarem-se à classe dominante. Quando a burguesia francesa cambiou o domínio da aristocracia, foi quando tornou possível a muitos proletários para escalarem a um nível acima do proletariado, mas somente porque eles se tornaram burgueses. Consequentemente, cada nova classe nada mais faz senão colocar o seu domínio sobre uma base mais ampla do que a precedente, sobre a qual fica também em oposição às classes não dominantes que ficam contra àquela que está dominante, de forma que se desenvolve, mais tarde, uma maior aspereza profunda. Estas duas circunstâncias fazem, assim, com que a luta a ser conduzida contra a classe dominante nova, esteja propensa a uma negação da situação social existente, mais decidida e mais radical do quanto tivesse sido possível a todas as classes que, precedentemente, haviam aspirado o domínio.
Toda esta simulação reside no domínio de uma determinada classe, e outra coisa coisa não é a não ser o domínio por certas ideias, e cessa naturalmente por si não apenas o domínio de classes em geral, mas cessa a forma de ser do ordenamento social, assim, não é mais só necessário representar um interesse particular como sendo universal ou <<o universal>> como o dominante.
Uma vez que as ideias dominantes têm sido separadas dos indivíduos dominantes e sobretudo dos relacionamentos que resultam em um dado momento no modo de produção, e juntam-se consequentemente ao resultado, porquanto na história as ideias sempre dominam; é facílimo extrair dessas várias ideias <<a ideia>>, etc, como aquela que domina na história e conceber assim todas essas ideias singulares, e conceitos, como <<autodeterminações>> do conceito que se desenvolve na história.
Então, também é natural que todos os relacionamentos dos homens possam vir extraídos do conceito do homem, do homem conforme é representado, da essência do homem, do homem. É isto que fez a filosofia especulativa. Hegel chega a confessar, no final da sua filosofia na história, <<de ter considerado tão-somente o processo do conceito>> e de ter exposto na sua história a <<verdadeira teodiceia>> [justificação de Deus]. Pode-se retornar, portanto, aos produtores <<do conceito>>, aos teóricos, aos ideólogos e aos filósofos, e de conseguinte atingir o resultado que os filósofos, os pensadores como tais, sempre dominaram na história; um resultado que, como vimos, já foi também manifestado por Hegel. De maneira que, todo o jogo de habilidade, para demonstrar a soberania do espírito, na história (hierarquia em Stirner), é reduzido aos seguintes três esforços:
1) Deve-se separar as ideias daqueles que dominam pelas razões empíricas, sob condições empíricas e como indivíduos materiais, desses dominadores, e com isto reconhecer o domínio de ideias ou ilusões, na história.
2) Deve-se colocar em ordem, nesse domínio, as ideias, demonstrar um nexo místico entre as ideias dominantes sucessivas, o que é atingido considerando-as como <<autodeterminações do conceito>> (a coisa é possível porque entre estas ideias, através da sua base empírica, existe realmente um nexo, e porque essas concebidas como ideias puras, tornam-se auto-distinções, distinções feitas pelo pensamento).
3) Para eliminar o aspecto místico deste <<conceito autodeterminantes>>, o transformamos em uma pessoa - e <<a autoconsciência>> - ou, para parecerem perfeitos materialistas, em uma série de pessoas que representam <<o conceito>> na história, e os <<pensadores>>, os <<filósofos>>, os ideólogos, os quais ainda uma vez são concebidos como os fabricantes da história, como << a reunião dos guardiães>>, como os dominadores. Com isto foram eliminados da história tudo os que são elementos materialistas e podem ser mitigadas tranquilamente as rédeas do corcel especulativo.
Ao passo que na vida ordinária qualquer shopkeeper [lojista] sabe distinguir muito bem entre aquilo que alguém deseja ser e aquilo que realmente é, a nossa historiografia ainda não chegou a este conhecimento óbvio. Ela acredita na palavra dita em cada época e assim se imagina ela própria.
Este método historiográfico que dominava principalmente na Alemanha, e especialmente por quem o dominou, é esclarecido removendo-se das suas conexões a ilusão dos ideólogos em geral, por exemplo as ilusões dos juristas, dos políticos (compreendidos os homens práticos do Estado), dos delírios dogmáticos desses tipos; onde a ilusão é simplesmente explicada pela sua posição prática na vida, pelas suas ocupações e pela divisão do trabalho.'

Marx - Engels, A Ideologia Alemã, primeira parte: A concepção materialista da história, Editores Reunidos, 1971, p. 72 - 77

Tudo aquilo que Marx escreve na "ideologia alemã" hoje aparenta estar superado e assimilado por toda cultura, mas muito menos pela percepção comum.

Um exemplo prático de tudo o que Marx escreve é a ideologia filosófica de Platão ou a de Paulo de Tarso. A ideologia filosófica de Platão era a filosofia que justificava a ditadura dos trinta tiranos impostos à Atenas por Esparta, enquanto a ideologia filosófica de Paulo de Tarso era a ideologia da escravidão imposta por ele, Paulo de Tarso, aos seus "seguidores".

Ambos os sistemas ideológicos têm sido descritos fora do contexto histórico e transformados em verdade absoluta, em ideias, boas para justificar cada ditadura e todo tipo de submissão das pessoas reduzidas à escravidão ou à servidão.

Todos os filósofos multiplicam as contradições do seu tempo e das suas vidas, conforme a posição pessoal que assumem na contradição das suas existências, mas do momento que o filósofo é um vendedor de palavras e não um vendedor de mercadorias ou de bens de consumo, para poder fornecer o seu corpo como bem de consumo, ele tem a necessidade de satisfazer o poder que lhe permite aderir aos bens de consumo em troca de palavras que legitimam o seu domínio. Em outras palavras, o filósofo faz a vez de puta do poder dominante. Mas, quando se faz de homem, se faz extremista promovendo um câmbio da realidade em que vive.

Quando Platão expandiu o seu pensamento, este foi afastado dentro de uma sociedade em que, uma vez debelada a ditadura, buscava ideias diferentes com as quais pudesse se assegurar. Só que as ideias de legitimação da ditadura são úteis a todo ditador, mesmo se o modo de apresentar a ditadura não é exatamente aquilo que o ditador pode executar. Deste modo, as ideias da ditadura são promovidas e interpretadas novamente para uso próprio como fez, por exemplo, o cristianismo com as ideias ditatoriais de Platão.

Em 1846 a Liga dos justos de Bruxelas, solicita a Marx e a Engels para nela serem admitidos e participarem. Em 1 de junho de 1847, durante o congresso londrino, a "Liga dos Justos" muda o nome para "Liga dos comunistas" e a palavra de ordem muda de "Todos os homens são irmãos" para "Proletários de todo o mundo, unam-se".

Em 1848 surge o "Manifesto do partido comunista".

Marx escreve no Manifesto do Partido Comunista:

'Sobre o que se baseia a família atual, a família burguesa? Sobre o capital e sobre o ganho privado. Plenamente ampliada ela existe somente para a burguesia, mas encontra o seu complemento na inevitável carência da família do proletariado e na prostituição pública.
A família dos burgueses cai naturalmente com a queda deste seu complemento, e ambos desaparecem com o desaparecimento do capital.
Repreendeis o querer abolir e superar a depauperação dos filhos por parte dos genitores?
Confessemos este delito.
Mas, dizei vós, colocando na posição da educação familiar a educação social, eliminemos as prestações de contas mais caras.
E, também, a vossa educação não é determinada pela sociedade? Pelos relacionamentos sociais, dentro dos quais educais com a interferência direta ou indireta da sociedade por meio da escola, e assim por diante? Não são os comunistas que inventam a ação da sociedade sobre a educação; nem modificam somente a característica, rompem com a educação pela influência da classe dominante.
As citações burguesas sobre a família e sobre a educação, acerca dos dispendiosos relacionamentos entre genitores e filhos, tornam-se nauseabundos cada vez mais, por meio da grande indústria, todos os vínculos de família do proletariado se rompem e os filhos são transformados em simples instrumentos de trabalho e artigos do comércio.
Mas, vós comunistas, quereis introduzir a comunhão das mulheres, só que toda a burguesia ladra.
O burguês enxerga na sua própria mulher um simples instrumento de produção. Ele suspeita que os instrumentos de produção devem ser usados pela comunidade, e, naturalmente, bem como não consegue ter em mente nada senão que o destino da comunhão atacará as mulheres do mesmo modo.
O burguês não conjectura que se trata, precisamente, em abolir e superar a posição das mulheres como simples instrumentos produtivos.
No restante, não há nada de mais ridículo como este hiper-moralismo asqueroso do nosso burguês a propósito da presumida coparticipação oficial das mulheres dos comunistas. Os comunistas não têm necessidade de introduzir a coparticipação das mulheres, que quase sempre existiu.
Os nossos burgueses, não contentes com isto, isto é, de terem à disposição as esposas e os filhos do seu proletariado, sem mencionarmos a prostituição oficial, encontram um grande deleite na sedução das suas próprias consortes, com reciprocidade.
O matrimônio burguês é, na realidade, a comunhão das mulheres. Pode-se, ainda mais, repreender os comunistas que desejam introduzir uma união das mulheres genuína e oficial no lugar de uma comunhão escondida hipocritamente. Obviamente, com a abolição e a superação dos relacionamentos de produção contemporâneos, desaparece também a comunhão das mulheres que derivam dela, isto é, desaparece a prostituição, seja a oficial seja a oficiosa.
Os comunistas têm sido, como se não bastasse, repreendidos de desejarem abolir a pátria e a nacionalidade.
Os operários não têm pátria. Não se pode tirar deles aquilo que eles não têm. O proletariado, num primeiro momento que conquistar o poder político, ele se eleva ao nível da primeira classe da nação, deve constituir-se em nação, ele mesmo ainda passa a ser nacional, embora não no sentido da burguesia.
O isolamento e os contrastes no seio do povo desaparecem sempre, cada vez mais, em qualquer tempo, com a disseminação da burguesia, com a liberdade do comércio, com o mercado mundial, com a uniformidade da produção industrial, e com as condições de vida correspondentes.
O domínio do proletariado fará com que despareçam ainda mais. Uma das primeiras condições para a sua liberação, pelo menos nos países civilizados, é a ação unificada.
Na medida em que é removido o lucro abusivo de homem sobre outro homem, vem a ser removida a utilização de um homem por outro, é removido o gozo de uma nação por meio de outra.
A hostilidade recíproca das nações morre com o antagonismo de classes dentro das nações.
As acusações contra o comunismo que são instigadas pelo ponto vista ideológicos, filosóficos e religiosos em geral, não merecem maiores discussões.
Há necessidade de uma ótica mais profunda, para compreender que os homens, com as suas condições materiais de vida, com os seus relacionamentos sociais, com a existência no meio social, mudem também as representações, os modos de ver, os conceitos, portanto, numa só palavra, a consciência?
Qual outra coisa a história das ideias demonstra senão que a produção do espírito se transforma junto com a material? As ideias dominantes de uma época têm sido, em cada momento, somente as ideias da classe dominante.
Fale-se sobre ideias que revolucionam uma sociedade inteira; fala-se com isto apenas do fato de que os elementos de uma nova sociedade formaram-se no interior da velha sociedade, que a dissolução das antigas condições de vida equivalem à dissolução das velhas ideias.
Quando o mundo antigo decaiu, as religiões antigas foram vencidas pela religião cristã. Quando, no século XVII, as ideias cristãs tiveram de sucumbir com as ideias iluministas, a sociedade feudal combateu a burguesia com uma luta mortal, então revolucionária. As ideias da liberdade de consciência e de religião falavam somente do poder da livre concorrência, no campo das consciências.
"Mas", dir-se-à, "as ideias religiosas, morais, filosóficas, políticas e jurídicas se modificam em cada momento do desenrolar do curso da história. A religião, a moral, a filosofia, a política e o direito mantiveram-se continuamente no meio dessas mudanças. Há além disso, outras verdades eternas, como a liberdade, a justiça, etc, que são comuns a todas as situações sociais. O comunismo, ao contrário, anula as verdades eternas, a religião e a moral, em vez de dar a elas uma forma nova, ele se coloca em contradição a todos os desenvolvimentos sociais ocorridos até agora".
Em que consiste essa acusação? A história de cada sociedade que existiu até os dias atuais desenrolou-se nos antagonismos de classe, que assumiram diversas formas em épocas diversas.
Mas, qualquer forma que tenham assumido, o abuso de uma parte da sociedade sobre a outra parte, é um dado de fato comum em todos os séculos precedentes.
Não é de admirar-se, de conseguinte, que a consciência social de todos os séculos coloque em movimento, a despeito de qualquer que seja a pluralidade e a diferença, determinadas formas comuns, em direção às estruturas que se dissolvem tão-somente com o completo desaparecimento do antagonismo de classe.
A revolução comunista é a ruptura mais radical das relações tradicionais de propriedade. Não há o que admirar que, no decorrer da sua evolução, a ruptura com as ideias tradicionais aconteça de maneira da mais radical possível.
Mas, deixemos as objeções da burguesia contra o comunismo.
Já vimos anteriormente que o primeiro passo da revolução operária, o tumulto do proletariado contra a classe dominante, é a conquista da democracia.
O proletariado se servirá, neste ponto, do seu domínio político para extorquir da burguesia, pouco a pouco, todos os capitais, para concentrar todos os instrumentos da produção nas mãos do estado, isto é, dos operários organizados como classe dominante, e para aumentar o mais rapidamente possível a multidão das forças produtivas.
No início pode somente ocorrer que, por meio de intervenções despóticas no direito de propriedade e nos relacionamentos burgueses para a produção, consequentemente através de medidas que aparentam ser economicamente insuficientes e pouco duráveis, mas que, no decorrer do desenvolvimento, ultrapassam elas próprias e são indispensáveis como meios para a sedição do sistema produtivo inteiro.
Estas medidas, naturalmente, serão todas as vezes diversas conforme os diversos países.
Todavia, para os países mais evoluídos poderão ser aplicadas aproximadamente as seguintes medidas.
1. Expropriação da propriedade latifundiária e o emprego da renda fundiária para as despesas do estado.
2. Tributo enérgico progressivo.
3. Abolição do direito de sucessão.
4. Confisco da propriedade.de todos os imigrantes e de todos os rebeldes.
5. Centralização dos créditos nas mãos do estado, mediante um banco nacional com capital estatal e monopólio exclusivo.
6. Centralização de todos os meios de transportes nas mãos do Estado,
7. Multiplicação da fábricas nacionais, dos instrumentos de produção, recuperação e melhoramento do latifúndio seguindo um plano comum.
8. Trabalho obrigatório e igual para todos; instituições de milícias industriais, especialmente para a agricultura.
9. Unificação da empresa agrícola e industrial: medidas aptas a removerem, gradualmente, o antagonismo entre cidade e campo.
10. Educação gratuita para todos os jovens. Abolição do trabalho de jovens, na fábrica. na sua forma atualizada. Unificação da educação com a produção de material para tanto, etc.

Karl Marx F. Engels, Manifesto do Partido Comunista, Demetra, 1996, p. 37 - 42

Se há qualquer coisa para dizer deste manifesto do Partido Comunista é que todas as ideias manifestadas não só realizaram-se nas sociedades socialistas, mas foram aderidas com convicção por cada sociedade ocidental. Elas foram assimiladas ao ponto de tornarem-se bandeiras "identificadoras" inclusive pela política Européia da direita.

Estas ideias entraram para fazer parte das Constituições ocidentais, e muitas das exigências manifestadas tornaram-se de tal modo importantes que são consideradas, hoje, crimes na sociedade. Como, por exemplo, o trabalho de menores nas fábricas, que é tão desejado pelos cristãos, não somente foi abolido, mas nos países europeus o trabalho de menores é um crime perseguido pela lei.

A mesma lição para a instrução obrigatória. A mesma instrução vale para a cooperação entre trabalho agrícola e trabalho industrial. Posteriormente, a sociedade se modificou e muitas exigências sociais mudaram, no entanto o mecanismo dos direitos sociais, iniciado pelo manifesto do Partido Comunista, alimentou a evolução da sociedade civil como hoje ela a vive.

Aos 22 de fevereiro de 1848, Paris se rebela e Luís Filipe da França é obrigado a fugir para Londres. A Prússia ainda pede a extradição de Marx, e quando os tumultos se estendem à Bélgica, Marx é preso e expulso da França.

Em 1848 Marx se dirige à Colônia onde vem a ser o fundador da Associação Democrática, hipoteca os seus bens para fundar o jornal "Nova Gazeta Renana".

Em 19 de maio de 1849 o jornal é molestado e fechado. Marx volta à Paris, mas o governo francês lhe dá ordem para abandonar a cidade e, assim, força-o a escolher entre ir para o exterior ou habitar uma região pantanosa da França. Marx parte para Londres.

Em Londres constrói novamente a Liga dos Comunistas e com outras forças, como os anárquicos, constrói a Associação Universal dos comunistas revolucionários.

Em 1852, os membros da secção marxista transferida à Colônia são processados e os seus membros condenados à alguns anos de reclusão.

Em 1851 surge "o 18 de brumário de Luís Bonaparte", um escrito no qual Marx analisa o golpe de Estado de 2 de dezembro de 1851.

Em Londres Marx vive num bairro pobre e, de modo econômico, num apartamento de dois cômodos. Alguns dos filhos morrem desnutridos e um de tuberculose.

No entanto, o clima social muda. Em 1857 uma crise econômica ataca o mundo todo. Naquele momento parece que o proletariado já estava se organizando. Em 22 de julho de 1864 sucede uma grande manifestação em Londres contra a ocupação czarista na Polônia, e aos 22 de setembro de 1864 tem lugar o congresso inaugural da "Associação internacional dos trabalhadores."

Em 1857 Marx escreve as "Grundrisse". Em uma carta Marx escreve a Engels em novembro de 1857:

"Trabalho como um louco, noites inteiras, para reassumir os meus estudos econômicos de maneira a esclarecer pelo menos os elementos fundamentais em "Grundrisse", antes do dilúvio."

O dilúvio social imaginado por Marx não sucedeu, mas vale a pena recordar alguns passos das Grundrisse.

Marx escreve nas Grundrisse:

'Toda produção é apropriação da natureza por parte do indivíduo no seu interior por procedimento de uma determinada forma social. Neste sentido é uma tautologia [Nota: Na lógica formal clássica, é proposição que, querendo definir algum objeto ou conceito, nada mais faz senão repetir acerca do predicado aquilo que já foi dito a respeito do sujeito (por ex.: civilismo e civismo)] afirmar que a propriedade (o apropriar-se) é uma condição da produção. Todavia é ridículo lançar-se daqui para uma determinada forma de propriedade, por exemplo a propriedade privada. (o que pressupõe em acréscimo também uma forma oposta, a não-propriedade, como condição). Na história a propriedade comum (como exemplo os indianos, os eslavos, os antigos celtas, etc.) aparece primeiramente como sendo a forma mais originária, uma forma que à maneira da propriedade comunitária, exerce um papel importante há longo tempo. Aqui ainda não se discute a questão se a riqueza se desenvolve melhor sob uma ou sob a outra forma de propriedade. Afirmar, todavia, que não se pode falar de uma produção, e portanto nem mesmo de uma sociedade na qual não existe alguma forma de propriedade, é uma tautologia. Uma apropriação que não se apropria de nada é uma contradictio in subjecto.
O pôr em seguro o que foi adquirido, etc. Se estas banalidades são reduzidas ao seu conteúdo real, estas nos falam mais do que aquilo que não supõem os seus divulgadores. E, em outros termos, que cada forma de produção produz as suas relações jurídicas, forma de governo, etc. A trivialidade e a pobreza conceitual consiste precisamente no referir-se a umas e outras, casualmente, coisas que estão ligadas organicamente, ao estabelecer-se uma conexão que é fruto da pura reflexão.
Aos economistas burgueses parece-lhes evidente que somente com a polícia moderna pode-se produzir melhor do que, por exemplo, com base no direito do mais forte. Eles esquecem apenas que, também o direito do mais forte constitui um direito, e que com uma forma modificada este sobrevive também no <<seu estado de direito>>.
Quando as condições sociais, correspondentes a um determinado nível da produção, estão ao ponto de surgirem ou de se dissolverem, então naturalmente sobrevêm desordem na produção, mesmo se em grau e efeito diferentes.
Recapitulando: existem determinações que são comuns em todos os níveis de produção, que pelo pensamento são asseguradas como sendo gerais; mas as condições gerais, assim denominadas, de cada produção, não são outra coisa senão estes momentos abstratos que não se encaixam em nenhum nível produtivo, histórico e real.

*A relação geral da produção com a distribuição, a permuta, o consumo.*

'Antes de prosseguir nas análises da produção, é necessário examinar as diferentes rubricas que os economistas colocam junto a ela.
A concepção que fazemos imediatamente é esta: na produção os membros da sociedade adaptam (produzem, dão forma) os produtos naturais às exigências humanas; a distribuição determina a relação na qual o indivíduo singular participa destes produtos; a permuta chega a ele pelos produtos particulares dos quais ele entende converter a cota que lhe é atribuída através da distribuição; finalmente, no consumo os produtos tornam-se objetos de desfrute, da apropriação individual. A produção cria os objetos correspondentes às exigências; a distribuição os subdivide com base nas leis sociais; a permuta redistribui de acordo com a exigência particular aquilo que já foi distribuído; concluindo, no consumo o produto sai desta movimentação social, torna-se diretamente objeto e servidor da exigência particular e a satisfaz na fruição.
A produção aparece, de conseguinte, como o ponto inicial, o consumo como o ponto de chegada, a distribuição e a permuta como o ponto intermediário, o qual pela sua vez se desdobra, uma vez que a distribuição é determinada como sendo o momento em que parte da sociedade, a permuta como sendo o momento em que parte dos indivíduos. Na produção objetiva-se a pessoa, na pessoa a coisa se subjetiva; na distribuição a sociedade se assume na intermediação entre a produção, o consumo na forma de normas que vigoram, gerais; na permuta a produção e o consumo são indiretos pela assunção precisa e casual do indivíduo.
A distribuição determina a relação (a quantidade), com que os produtos estão em contato junto aos indivíduos; a permuta determina o tipo de produção com que o indivíduo exige a sua cota que lhe é conferida pela distribuição.
De tal modo, produção, distribuição, permuta e consumo constituem um verdadeiro e exato silogismo: a produção é a comum, isto é, a válida a todos, a distribuição e a permuta representam o particular, o consumo é a singularidade com que tudo é concluído. Aqui temos, efetivamente, um conexão, mas uma conexão superficial. A produção é determinada por leis universais da natureza; a distribuição pela casualidade social, todavia esta pode exercer um efeito mais ou menos benéfico sobre a produção; a permuta se insere entre uma e outra como um movimento social formal, e o ato conclusivo do consumo, que não é concebido apenas como última finalidade mas também como meta final, enfim tudo somado está fora da economia, salvo que na medida em que reage pela sua vez no ponto de partida, orientando novamente o processo todo.
Os adversários dos economistas políticos - são os perseguidos no interior ou no exterior do seu âmbito -, os quais os repreendem por desarticular barbaramente aquilo que pertence a um todo que é único, colocam-se sobre o mesmo terreno ou em posição inferior a eles. Nada circula mais na crítica, conforme a qual os economistas observariam muito e exclusivamente a produção, como sendo um fim nela mesma. Tal crítica edifica-se precisamente sobre a concepção econômica, segundo a qual a distribuição se coloca, enquanto esfera autônoma e independente, ao lado da produção. Ou então [sustenta-se], que os momentos não seriam aproveitados na unidade delas. Como se esta dilaceração não passasse pela realidade nos tratados teóricos, mas ao contrário dos tratados teóricos conforme à realidade, e como se aqui houvesse o que fazer com uma adequação dialética de conceitos, e não com a compreensão das relações reais!

[consumo e produção]

A produção inclusive é imediatamente consumo. Duplo consumo, subjetivo e objetivo: o indivíduo que ao produzir desenvolve as suas próprias capacidades, também as emprega, consuma-as no ato da produção, particularmente como a procriação natural é um consumo de forças vitais. Em segundo lugar: consumo dos meios de produção que são usados e consumados e em parte (como por exemplo no caso da combustão) novamente desagregados nos elementos gerais. O mesmo diga-se da matéria prima, que não permanece na sua forma e condição natural, mas é antes consumada. O ato da produção em si mesmo é, portanto, em todos os seus momentos, igualmente ato e consumo. Mas, isto é admitido pelos economistas. A produção por meio idêntico imediato com o consumo, e este imediata e identicamente coincidente com a produção, a isto os economistas chamam de consumo produtivo. Esta identidade de produção e consumo se reduz à proposição de Spinosa: determinatio est negatio.
Mas, esta definição do consumo produtivo, é precisamente fornecida somente com a finalidade de separar o consumo idêntico à produção do consumo verdadeiro e próprio, o qual é concebido, ao invés, como antítese destrutiva da produção. Consequentemente, tomemos para exame o consumo próprio e verdadeiro. O consumo é imediatamente inclusive produção, como o consumo na natureza dos elementos e das substâncias químicas é produção da planta. O exemplo de que ao nutrir-se, que constitui uma forma de consumo, o homem produz o seu próprio corpo, está evidente. Mas, isto vale para qualquer outro gênero de consumo que, de um modo ou de outro, de uma certa maneira produz o homem. Produção consumadora. Todavia, diz a economia, esta produção idêntica ao consumo, constitui uma segunda produção resultante da destruição do primeiro produto.
Na primeira o produtor se concretizava, na segunda se personifica a coisa criada por ele. Esta produção consumadora - embora seja uma unidade imediata de produção e consumo - é de conseguinte fundamentalmente diversa da produção própria e verdadeira. A unidade imediata em que a produção coincide com o consumo e o consumo com a produção, faz com que subsista a sua dualidade imediata.
A produção é assim consumo imediato, o consumo é produção imediata. Cada um é o seu contrário imediato. Ao mesmo tempo, no entanto, tem lugar um movimento mediato entre as duas partes. A produção intercede no consumo, no qual ela cria o material e ao qual sem ela faltaria o objeto. Mas, o consumo por sua vez intercede na produção; de fato é somente ele que cria o sujeito para os produtos, o sujeito para o qual esses são os produtos. O produto atinge o seu fim último tão-somente no consumo. Uma ferrovia na qual não se viaja, e que assim não é usada, não é consumada, é apenas uma ferrovia em potencial, na realidade não desempenha o papel de ferrovia. Sem produção não há consumo; mas também sem o consumo não há produção, do momento que em tal caso a produção não teria escopo.

Karl Marx, Elementos fundamentais de crítica à economia política, Grundrisse, Einaudi, 1976, p. 10 - 14

No caos social que está para suceder em seguida à crise econômica, Marx se esforça para modelar os seus estudos individuais de economia. Os estudos da economia marxista têm a função de responder à pergunta que o homem faz a si mesmo: em que mundo vivo?

Se o homem não conhece o mundo em ele vive, nem ao menos está em condições de organizar racionalmente a sua vida. Até ontem contava-se que o mundo foi criado por Deus e que ele não podia conhecer a criação de Deus, devia somente adaptar-se às condições que a criação lhe apresentava. Marx pretende mudar esses termos. Para Marx não é Deus que age no mundo, porque Deus é o produto da imaginação do homem, mas é o homem que age através das relações produtivas entre ele e o mundo, bem como entre ele e os outros homens.

Se a filosofia, que precedeu Marx, se interessava em contar ao homem como era o mundo imaginado de Deus; eis que, de outro modo, Marx narra ao homem como é o mundo das relações econômicas e para que ele possa agir em tais relações modificando-as com vantagens particulares.

O universo de Marx não é um universo que é dominado por Deus ou pelo espírito, é um universo constituído por corpos de homens que transformam mercadorias em produtos que são consumados por eles mesmos ou por outros homens. Marx conduz o homem da relação com o mundo divino à relação com o mundo da economia, do trabalho e da finança.

A citação que eu reproduzi da Grundrisse esclarece muito bem a relação entre o homem e a economia. Cada produção é apropriação por parte do homem, da natureza. Por meio da produção o homem se apropria da natureza transformando os fins, da porção da qual se apropriou, para satisfazer seus desejos e necessidades particulares.

De conseguinte, temos o acúmulo da produção quando se deseja assegurar aquilo que se adquiriu. Ao mesmo tempo, Marx expõe como a produção, distribuição e consumo estão estreitamente ligados, onde a produção é consumo e o consumo é produção que aumenta a necessidade da distribuição para acrescer, posteriormente, o consumo que requer, por sua vez, a produção.

Com esta ação do homem há a contínua modificação do mundo. E, sendo o mundo composto pela produção da economia, não somente é modificado pela atividade do trabalho, mas o próprio trabalhador, o produtor e o consumidor de bens, são pela sua vez modificados pela atividade articulada durante o trabalho.

O que se forma, na filosofia marxista, não é o fato, mas o próprio homem que mediante a transformação, de parte da natureza, para o regozijo dos seus apetites, modifica continuamente a si mesmo e as próprias condições da vida.

Marx ainda escreve nas Grundrisse a propósito do lucro:

*Variações permanentes no ensaio do lucro. Divisão do preço do produto entre capitalistas e trabalhadores.*

'O valor total das mercadorias do locatário que cultiva a terra, que estabelece o preço, e do fabricante que produz as mercadorias, é dividido em duas porções apenas: uma que constitui as vantagens do capital, a outra os salários do trabalho (p. 107). Se o trigo e os artefatos fossem sempre vendidos pelo mesmo preço, os lucros seriam elevados ou baixos na medida em que os salários fossem baixos ou elevados. Se o preço do grão aumenta porque ocorre uma quantidade maior de trabalho para a sua produção, aumentam os salários e diminui o lucro. Se um fabricante vende as suas mercadorias por 1000 libras esterlinas, o seu lucro depende do fato de que os salários implicam em 800 ou somente 600 libras esterlinas. A inflação do produto em bruto age ao mesmo tempo sobre o locatário...Por isso efetivamente ele paga por um ganho, ou deve empregar um número adicional de trabalhadores para obter o mesmo produto, e o preço adicional corresponde a uma destas duas despesas excedentes, mas não será recompensado com o aumento do salário (p. 108). O produto do agricultor fornece pode ser de 180, 170, 160 ou 150 quarters, em cada caso ele obtém, como inicialmente para os 180, assim sucessivamente para os 170 etc. quarters 720 libras esterlinas; o preço aumenta em proporção inversa em relação à quantidade (pp 112, 113). Os lucros não podem nunca aumentar ao ponto de as 720 libras esterlinas não sobrarem suficientemente para os bens absolutamente necessários serem divididos aos operários; nem, por outro lado, nunca os salários podem aumentar ao ponto de não sobrar, deste montante, uma parte para os lucros (p. 113). Nós ignoramos as variações acidentais devidas às boas ou más colheitas, ou o aumento, ou à diminuição, sobre a questão determinada por um efeito qualquer de improviso acerca da situação da população.
Falemos do preço ordinário e constante do grão (p. 114 nota). O agricultor está consequente e fortemente interessado a manter baixos os preços ordinários do produto em bruto. Assim faz porque de um lado ele é consumidor, por outro lado porque emprega no trabalho (p. 114).
São poucas as mercadorias cujo preço não é influenciado pelo aumento do produto em bruto, porquanto uma parte do produto em bruto sempre entra na sua composição. Elas encarecem porque no produto em bruto, do qual são elaboradas, é empregado mais trabalho, não porque os fabricantes pagam mais os operários que eles empregam. De qualquer modo, as mercadorias encarecem porque nelas são gastos mais trabalho, não porque o trabalho utilizado nelas tem um valor maior. Os artigos da joalheria, o ferro, as chapas metálicas e o cobre não aumentariam, pois na composição deles não algum produto bruto sobre a superfície da terra (p. 117). Os efeitos produzidos em relação aos lucros seriam os mesmos ou aproximadamente os mesmos, se fosse verificado um aumento de preço dos outros bens necessários, com exceção dos gêneros alimentícios, nos quais são gastos os salários dos trabalhadores (p. 118). Com o aumento do preço de mercado de uma mercadoria, que ultrapasse o seu preço natural, neste ramo de atividade particular, o lucro naturalmente supera o nível geral dos lucros. Mas isto é apenas um efeito temporário (pp. 118, 119). Os lucros dependem do nível alto ou baixo dos salários, o salário pelo preço dos bens necessários, e o preço dos bens necessários, essencialmente, pelo preço dos gêneros alimentícios (p. 119).
35 O lucro tende naturalmente, portanto, a diminuir uma vez que, com o progredir da sociedade e da riqueza, os gêneros alimentícios adicionais requerem uma quantidade crescente de trabalho. Esta tendência, esta gravitação do lucro é inibida em períodos intermitentes provisórios pelo aperfeiçoamento do maquinário, vinculados à produção dos bens necessários, além do que pelas descobertas da ciência agrícola que reduzem os custos da produção (p. [120, 121). Com o aumento do preço natural dos gêneros alimentícios aumenta também o preço dos outros bens necessários, havendo como causa o valor da matéria-prima incrementado da qual são feitos, o que aumentaria ulteriormente os salários e diminuiria os lucros (pp. 122, 123). O agricultor e o fabricante não podem viver sem lucros, exatamente como o operário não pode viver sem salário. O impulso deles para a acumulação diminuirá com cada diminuição do lucro e cessará totalmente no momento em que os seus lucros não assegurarão uma compensação adequada à perturbação e ao risco que comporta o emprego produtivo do capital (p. 123). No restante, o ensaio dos lucros cairia ainda mais rapidamente do que foi delineado acima, visto que quando o produto encarece muito, o valor do capital do agricultor vem a aumentar muito porque consiste, necessariamente, em um grande número de mercadorias que aumentaram de preço. Se o seu lucro era de 6% sobre o capital originário, agora ele é de 3% somente. Por exemplo, 3000 libras esterlinas a 6% rendem 180 libras esterlinas. 6000 libras esterlinas a 13% rendem também 180 libras esterlinas. Nestas circunstâncias e nestas condições, somente um novo agricultor que tem no bolso 6000 libras esterlinas poderia entrar para a atividade agrícola (pp. 123, 124).
Igualmente próxima a uma parte dos fabricantes tem lugar para uma compensação parcial. O fabricante de cerveja, o destilador, o fabricante de tecidos e aquele do linho são parcialmente compensados pela redução dos lucros, mas pelo aumento do valor das suas provisões de matéria-prima e de produtos esgotados; mas não é assim no caso do fabricante do ferramental de artigos de joalheria, etc., como no caso daqueles cujo capital consiste exclusivamente de dinheiro (p.124).
Por um outro lado: mesmo admitindo-se que o ensaio do capital dos lucros diminua em continuação à acumulação de capital nos campos, e ao aumento dos salários, o montante geral dos lucros deve de qualquer maneira aumentar. Se, portanto, supormos em seguimento às acumulações repetidas de 100000 liras esterlinas a análise do lucro diminua de 20 a 19, 18, 17%, podemos aguardar que a soma global dos lucros obtidos pelos possuidores de capital sucessivos progrida constantemente; que esta seria maior com um capital de 200000 do que com um capital de 100000 libras esterlinas; que seria ainda maior se fosse de 300000; e portanto sempre crescente, embora um experimento que diminui com cada aumento de capital.
Mas, este avanço só é verdadeiro durante um tempo determinado: assim, os 19% sobre 200000 libras esterlinas é mais de 20% sobre 100000; os 18% sobre 300000 é mais de 19% sobre 200000; mas depois que o capital foi acumulado em grande quantidade e os lucros diminuídos, a acumulação ulterior diminui conjuntamente os lucros. Se, portanto, suponhamos que a acumulação seja de 100000 e os lucros de 7%, a soma cumulativa do lucro será de 70000 libras esterlinas; se neste ponto ao milhão acrescentam-se 100000 libras esterlinas de capital e os lucros caem a 6%, os proprietários do capital ganham 66 000 libras esterlinas, sofrendo uma redução de 4000 libras esterlinas, se bem que o total do capital tenha aumentado de 1000000 para 1100000 libras esterlinas (pp. 124, 125). Todavia, até que o capital renda um lucro, não pode haver lugar a alguma acumulação de capital que não implique não somente um aumento do produto, mas um aumento do valor. Com o emprego de 100000 libras esterlinas de capital adicional, nenhuma parte do capital precedente torna-se mais improdutiva. O produto da terra e do trabalho deve aumentar e o seu valor deve crescer, não somente por causa do valor dos acréscimos efetuados à quantidade precedente das produções, mas devido ao novo valor que é fornecido ao produto total da terra, pela crescente dificuldade de produzir a última porção dele. Se, porém, a acumulação do capital torna-se grandíssima, a despeito desse seu valor que lhe foi acrescido, ele é distribuído de tal modo que um valor menor que, no passado, foi apropriado aos lucros, aumenta o que é destinado ao ganho e aos salários...adquirido um certo nível, proprietários e trabalhadores obterão mais do produto adicional e, graças à sua situação, estarão em condições de gastar até os ganhos precedentes do capitalista...Os únicos a tirarem realmente vantagem seriam os proprietários das terras, uma vez que obteriam mais produtos e em troca maior valor...O salário aumentado para operário seria puramente nominal e até cairia...Se bem que tenha se produzido um valor maior, uma proporção maior daquilo que resta deste valor, e depois que foi paga a renda é consumida pelos produtores, e é isto, apenas isto que regula os lucros...Uma proporção maior da parte do produto que permanece após o pagamento da renda para ser distribuída entre os capitalistas e os operários assalariados, é conferida a estes últimos. Qualquer homem pode obter menos, mas uma vez que está na proporção de todo o produto contido pelo locatário, então são empregados mais operários, dos salários será absorvido o valor de uma proporção maior do produto todo, e de conseguinte para os lucros crescerá o valor de uma proporção menor (pp. 125-128).
A dissertação do lucro depende, portanto, da quantidade de trabalho indispensável para produzir os gêneros necessários sobre a terra, que não goza de ganho. Os efeitos da acumulação são consequentemente diversos, em diversos países e, particularmente, dependem da fertilidade do terreno (p.128).
Temos visto que o preço em dinheiro das mercadorias - independentemente do fato de o ouro ser ou não o produto do país em questão - não aumenta com o aumento dos salários. Mas, suponhamos que o contrário seja verdadeiro. Se os preços das mercadorias aumentassem em concomitância com os salários altos, isto a despeito do aumento do salário, reduziria o lucro. Suponhamos que o chapeleiro, o fabricante de meias e o sapateiro paguem algumas 10 esterlinas a mais pelos salários e que também os seus produtos aumentem para 10 libras esterlinas; em tal caso, a situação deles não melhoraria. Se o fabricante de meias vende o seu produto a 110 ao invés de 100 libras esterlinas, os seus lucros são constituídos pela mesma soma em dinheiro que obtinha antes; mas em troca destas 110 libras esterlinas ele obteria um décimo a menos dos chapéus, sapatos e qualquer outra mercadoria, e uma vez que com este montante precedente de parcimônias ele poderia obter menos operários com salários aumentados e comprar menos matéria-prima com preços aumentados, a sua situação não seria melhor do que aquela em que se encontraria se a cifra dos seus lucros em dinheiro fosse realmente diminuída e cada coisa permanecesse no seu velho preço...De fato seria simplesmente diminuído o valor do dinheiro no qual estão estimados os preços e os lucros (pp. 129, 130).

Karl Marx, Elementos fundamentais de crítica da economia política, Grundrisse, Einaudi, editor, 1976, p. 1005 - 1009

As Grundrisse antecipam O Capital. Com Marx o homem analisa um novo mundo onde se manifesta a sua vida. Um mundo que do real se torna o mundo da filosofia: o trabalho, a finança, as relações econômicas entre os homens.

Platão inventa o reino da Atlântida e imagina uma República organizada por classes onde se pratica a eugenia para manipular e controlar os homens, Agostinho organiza a sua filosofia em função da "Cidade de Deus". Tommaso Campanella conduz a sua filosofia à "cidade do Sol". Hobbes coloca a sua filosofia no mundo do Leviatã. Mundos que iguais aos mares decidem acerca da transformação do pensamento do filósofo. Ao contrário destes, Marx esclarece a evolução do seu pensamento filosófico nas relações econômicas, e as relações econômicas tornam-se o mundo no qual Marx faz filosofia e o homem vive.

As citações que apresentei demonstra, muito bem, a investigação minuciosa feita por Marx para poder compreender os mecanismos da formação do salário e do lucro. Em Marx não existe uma sociedade ideal, existe a sociedade atual onde os homens constroem os seus relacionamentos em função de futuro possível.

Tendo a intenção de retomar Marx e a sua análise da estrutura econômica da sociedade, no seu tempo, podemos dizer que nela estás: sejas tu um capitalista, um banqueiro, um assalariado, um locatário, ou conheces os mecanismos econômicos da sociedade em que vives, ou mesmo que estejas destinado à falência. Ao falires, então, chegas a desejar a Cidade de Deus, de Agostinho, subida ao céu com o corpo de Paulo de Tarso, à Cidade do Sol de Campanella, mas tal desejo limita-se a certificar todo o teu fracasso na existência, que depois, que assim fosse, qualquer tribunal atesta subtraindo os teus bens materiais.

Aos 26 de junho de 1865 Marx apresenta o estudo "Salário, preço e lucro".

Aos 13 de setembro de 1868, a ala proudoniana deixa a associação enquanto a ala da esquerda se aproxima das posições marxistas. Decidiu-se divulgar o primeiro livro de "O Capital" editado por Marx em 1867.

Nesta biografia não comento O Capital, de Marx. É uma obra de análise da estrutura econômica e das dinâmicas das relações econômica-financeiras. É mais um estudo da realidade de ser que merece diligência dos estudiosos de economia, não com interesses filosóficos ou políticos. No que se refere à centralização da economia na filosofia e no pensamento político de Marx, ela parece evidente em todos os outros escritos de natureza sócio-filosófica de Marx em relação aos quais prefiro concentrar a atenção ao que diz respeito a esta biografia. O Capital, de Marx, é uma obra de tal forma importante que condiciona a economia tanto de eventuais Estados socialistas, como de países capitalistas, por pelo menos mais de dois séculos. O capitalista ou o homem de negócios que não conhece o Capital, de Marx, é um capitalista péssimo e um homem de negócios péssimo.

Em 1870 é deflagrada a guerra entre a França e a Prússia. Após haver conciliado, durante a guerra, ficando entre diferentes posições dos operários franceses e prussianos, Marx denuncia os propósitos comunicativos de Bismark e tenta dissuadir os operários franceses de uma tentativa de insurreição em Paris, desejado pelos radicais, blanquistas e anárquicos. A Comuna francesa acabará em um banho de sangue.

Em 1871 é aberta em Londres a conferência da Primeira Internacional, na qual Marx apoia a indivisibilidade da ação econômica com a ação política. Ele encontra oposição de Bakunin que temia a insurreição do subproletariado e dos camponeses pobres.

Em 1875, Marx escreve "Crítica ao programa de Ghota". Em maio de 1875 tem lugar o congresso da Associação Geral dos Operários Alemães que fundaram o Partido Socialista dos Trabalhadores que se transformará em SPD. Marx toma posse do programa do congresso e escreve uma crítica: "Crítica ao programa de Gotha", na qual contrapõe as suas ideias ao socialismo de então. A SPD tinha assumido posições marxistas somente no final de 1800.

Marx escreve na Crítica ao Programa de Gotha:

'Tratei minuciosamente do <<rendimento integral do trabalho>>, de uma parte do <<direito igualitário>> e da <<distribuição justa>> por outro lado, para demonstrar qual é o delito grave que se comete quando, por uma das partes, desejam impor conceitos ao nosso partido, como dogmas, conceitos estes que em um certo período tinham um significado, mas que agora transformaram-se em frases ultrapassadas; por outro ângulo, o modo de ver realisticamente as coisas de forma que foi alcançado com esforço pelo partido, mas que no momento enraizou-se nele, e novamente vem a ser deformado por mentiras ideológicas de caráter jurídico e similares, e deste modo difundidas entre os democráticos e os socialistas franceses.
Além disso, o que tratamos até aqui, estava errado sobretudo fazer da dita <<distribuição>> como sendo a essencial e principalmente destacá-la, colocando-a em evidência.
A distribuição dos objetos de consumo é, por sua vez, apenas a consequência da distribuição das próprias condições de produção. Mas esta última distribuição é uma característica do modo de produção em si mesmo. O modo de produção capitalista, por exemplo, se baseia no fato de que as condições reais da produção são destinadas aos que não são operários, sob a forma de propriedade do capital bem como propriedade da terra, enquanto a maioria possui tão-somente a condição pessoal da produção, da força-trabalho. Dado que os elementos da produção são distribuídos desta forma, segue-se, de conseguinte, que temos a distribuição hodierna dos meios de consumo. Se as condições de produção objetivas constituem propriedade coletiva dos trabalhadores, resulta que, do mesmo modo, uma distribuição dos meios de consumo passa a ser diferente da atual. O socialismo vulgar (e com ele inclusive uma parte da democracia) adotou dos economistas burgueses o hábito de considerar e tratar a distribuição como sendo independente do modo de produção, e consequentemente de apresentar o socialismo como algo que gire ao redor da distribuição. Após o esclarecimento da relação real, que já sucedeu há muito tempo, por quê voltar atrás?

 

4. A emancipação do trabalho deve ser obra da classe operária, que em comparação a ela todas as outras classes são apenas uma multidão reacionária.

 

A primeira estrofe é extraída das palavras introdutórias dos estatutos internacionais, mas <<exatas>>. Lá está a afirmação : - A emancipação da classe operária deve ser obra dos próprios operários - Aqui, ao contrário, a <<classe operária>> tem de liberar ...o que? <<O trabalho>>. Entenda quem pode. Em troca, a antístrofe é uma citação típica de Lassalle: <<em confronto (com a classe operária) todas as outras classes são apenas uma multidão reacionária>>.
No Manifesto comunista se diz: <<De todas as classes que atualmente se opõem à burguesia, somente o proletariado ao invés é o seu produto mais autêntico>>.
A burguesia é considerada aqui classe revolucionária como transportadora da grande indústria, em relação às classes feudais e à categorias médias, as quais querem manter todas as posições sociais que são a imagem de métodos de produção retrógrados. Estas classes, de conseguinte, não formam junto com a burguesia, tão-somente uma massa reacionária.
Por outra parte, o proletariado é revolucionário em relação à burguesia já que, ele próprio cresceu no terreno das grandes indústrias, luta para romper na produção a característica capitalista, que a burguesia procura eternizar. Mas o Manifesto acrescenta que: <<as classes médias tornam-se revolucionárias...tendo-se em vista a sua passagem próxima ao proletariado>>.
Também, concluindo-se, sob este ponto de vista, é um absurdo afirmar que estas adestram-se junto à burguesia, e em acréscimo com os feudais, sendo apenas uma multidão reacionária. Durante as últimas eleições (1874) talvez tenha sido dito aos artesãos, aos pequenos industriais, etc. bem como aos camponeses: diante de nós vós sois juntos com a burguesia e aos feudais apenas uma multidão reacionária?
Lassalle conhecia prontamente o Manifesto comunista assim como os seus seguidores conheciam as escrituras sagradas compostas por ele. Se ele, portanto, alterou-a temos que: de um modo grosseiro, isto aconteceu somente para justificar a sua aliança com os opositores feudais e absolutistas contra a burguesia.
No parágrafo mencionado, além disso, foi extraída a sua sentença sem nexo algum com a citação estropiada do estatuto internacional. Aqui nos encontramos de frente a uma impertinência tal que não desagrada nem mesmo ao Sr. Bismark, uma daquelas impertinências que a preço conveniente, é mercancia do Marat de Berlim (2).

5. A classe operária ocupa-se com a sua emancipação própria, em primeiro lugar, no âmbito do Estado nacional atual, consciente do resultado necessário decorrente da sua luta, que é universal ao que se refere a todos os trabalhadores, de todos os países civis, um resultado que será a confraternização internacional dos povos.

Lassalle havia considerado o movimento operário de um modo do mais restrito possível sob o ponto de vista nacional, em contraste com o Manifesto comunista e com todo o socialismo precedente. Segue-se a isto precisamente após a atividade internacional!
Entende-se por si mesmo que para poder, no geral, combater a classe operária existe a condição de organizar-se no país específico, em casa própria, como classe, e que no interior de cada país haja o teatro imediato da sua luta. Por isso, a sua luta de classe é nacional, conforme estabelece O Manifesto comunista, não pelo conteúdo, mas pela <<forma>>. Mas, o âmbito do Estado nacional atual, por exemplo, do Reich alemão, encontra-se, por sua vez, economicamente, no âmbito do mercado mundial, politicamente <<no âmbito do sistema dos Estados>>. O primeiro comerciante que se apresenta, toma consciência de que o comércio alemão é contemporaneamente comércio exterior e a grandeza do sr. Bismark consiste precisamente na sua espécie de política internacional.
E a que coisa o Partido operário alemão reduz o seu internacionalismo? À conscientização de que o resultado da sua luta <<será a confraternização internacional dos povos>>, uma frase tomada emprestada pela Liga burguesa para a liberdade e a paz [Organização internacional dos democratas burgueses], que deve passar por equivalente, para a confraternização internacional da classe operária na luta comum contra as classes dominantes e os seus governos.
Das funções internacionais da classe operária, alemã, nem ao menos uma palavra, portanto! E, assim, esta deveria oferecer-se como unida à própria burguesia já confraternizada, isto é, contra ela mesma, unida com a burguesia de todos os outros Países e à política de conspiração internacional do sr. Bismark [1873 aliança dos três imperadores contro o que é O Internacional].
De fato, a ostentação de fé internacionalista do programa está infinitamente debaixo daquela do partido do livre-câmbio. Também este sustenta que o resultado da própria luta é <<a confraternização internacional dos povos>>. Este partido inclusive faz alguma coisa para tornar internacional o comércio e não se contenta de algum modo com o conhecimento de todos os povos, no próprio País, na casa deles, para que exerçam o comércio.
A atividade internacional da classe operária não depende de algum modo da existência da <<Associação internacional dos operários>>. Esta foi apenas a primeira tentativa para construir um órgão central dessa atividade; tentativa que, pelo impulso que deu, teve um resultado permanente, mas, na sua primeira forma histórica, não podia mais ser mantido depois da queda da Comuna de Paris. A <<Nortedeutsche>> de Bismark estava com total razão quando anunciava, para satisfazer o seu patrão, que o Partido operário alemão tinha, no seu programa, renegado o internacionalismo [20 de março de 1875, Nortedeutsche Allgermeine Zeitung - artigo de fundo].'

Karl Marx, Crítica ao programa de Gotha, Edições Samonà Savelli, 1972, p. 39 - 43

A Crítica ao programa de Gotha delineia um texto que muito bem representa a visão marxista em contraposição à visão socialista, bem como insere o homem naquilo que ele é no mundo. "A emancipação da classe operária deve ser obra dos próprios operários". Trata-se de uma afirmação filosófica que aparentemente é, nos dias de hoje, "lapalissiano", mas que se contrapõe a um sistema de pensamento, isto é, antagonista à toda a filosofia da salvação propagandista do cristianismo. Em outros termos, é Jesus que vem sobre as nuvens com grande poder para salvar a humanidade, assim assevera o cristianismo.

Ser os próprios propagandistas da existência particular e conscientes de que ninguém pode liberar outrem de condições opressivas, senão o próprio oprimido, mudando as condições da sua existência pessoal.

Além disso, a crítica marxista coloca-se contra não somente às divisões de classes da sociedade, mas também contra o delírio de quem, exaltando os operários, como casta ideológica, desejaria colocar os operários em guerra contra todas as pessoas de outras classes sociais igualmente abusadas, embora portadoras de algum privilégio social.

O mesmo vale para a finalidade da luta para mudar o presente que os socialistas querem encerrar em uma visão idealista, a confraternização, quando de fato, a classe operária, enquanto classe nacional, nunca combateu contra a classe operária de outros povos. Falar em atingir a confraternização dos povos significa querer que os operários assumam como próprias, em nome de uma bandeira nacional, as guerras entre nações como aquela, de não há muito tempo, da Alemanha contra a França. O nacionalismo não se destina a Marx, mas muito menos a negação da nação.

Aos 2 de dezembro de 1881 morre a esposa de Marx. Marx se desespera. Em 1882, janeiro, ele perde também a sua primeira filha. Marx não se restabelece mais e morre aos 14 de março de 1883.

Qualquer coisa que se deseja dizer de Marx, na sua vida não há um só compromisso com o poder que domina os homens. Ele viveu como cidadão que contesta a autoridade e morreu como um cidadão. A sua filosofia da existência está coerente com o modo como ele viveu. Esta sua filosofia pode ser discutida ou criticada, mas constitui uma filosofia que não esconde segundas intenções, pois o fim segundo é o da libertação do homem no espaço de tempo em que ele vive.

 

Marghera, 08 de setembro de 2018 - revisão em 5 de outubro de 2019

 

 

A tradução foi publicada 10.08.2020

Aqui você pode encontrar a versão original em italiano

 

 

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